Por que se resiste a tratar de política na igreja?
Início hoje uma série de três postagens sobre o cristão e a política. Ainda temos
certa resistência de tratar de política como um tema bíblico, que não pode ser
relegado como algo de somenos importância ou sem qualquer conexão com a nossa
vida cristã. Há razões para tal comportamento. Elas estão arraigadas em nosso
meio ao longo da história evangélica em nosso país. Quem se atreve a falar de
política ainda corre o risco de ser estigmatizado como desviado, como alguém
que perdeu a fé, que está com as duas pernas no fogo do inferno. Pelo menos foi
o que ouvi há poucos dias de alguém nas redes virtuais.
Entre outros
motivos para a resistência está o fato de o evangelho ter sido plantado no
Brasil através de missionários estrangeiros, que, por força de lei, não podiam
imiscuir-se nos assuntos internos. Por este motivo, não tomaram a iniciativa de
formar os crentes para exercerem a cidadania de forma plena. Eram orientados em
outros aspectos, principalmente no que respeita a obediência às autoridades,
sem nenhuma ênfase à participação na vida do país. Havia até certo ponto uma
espécie de alienação, embora houvesse alguma militância de setores mais engajados.
Outra razão
era – e ainda o é em alguns segmentos evangélicos – a dicotomia entre o sagrado
e o secular. Compartimentava-se a vida cristã numa espécie de “gueto”, como se fosse
separada da vida de todos os dias, enquanto lá fora deixávamos por conta dos
outros tarefas ditas que pareciam não ter qualquer relacionamento com a nossa
vida de fé. É a teoria dos pavimentos desenvolvida por Francis Shaeffer e
posteriormente por Nancy Pearcey. O sagrado restringia-se ao pavimento de cima,
enquanto o secular ao pavimento debaixo, sem nenhuma interconexão entre eles.
Não se deve
esquecer, também, a ênfase na volta de Cristo, que, ao invés de ser apresentada
como a bendita esperança da Igreja, tornava-se uma forma de fuga, de escapismo,
que levava os cristãos à passividade e a eximir-se de responsabilidades ditas
seculares, esquecendo-se do que disse Jesus em sua oração sacerdotal: “Não peço
que os tires do mundo, mas que os livres do mal”. Eu mesmo me lembro de ter
pregado algumas vezes, na minha juventude, dizendo que não se preocupassem,
caso não tivessem boas casas, vivessem em condições de pobreza, pois no céu
andariam em ruas de ouro e morariam em mansões resplendentes.
É óbvio que a
volta de Cristo é o nosso maior anseio, mas assim como Jesus, que não deixou de
trabalhar até chegar o momento de cumprir o propósito para o qual veio ao
mundo, temos de cumprir com as nossas obrigações com o olhar no céu e os pés na
terra até que ele venha. Vida cristã é uma só para ser vivida em qualquer
dimensão em que estivermos, sem nos eximirmos do dever de salgar o mundo e de
fazer brilhar a nossa luz. Não se espera, à luz da Bíblia, outro comportamento
do cristão.
Junte-se a
isso, no mundo contemporâneo, o descrédito da classe política como fator de
desestímulo para se falar de política e admiti-la como um tema bíblico. Embora,
na história, encontremos homens
que honraram a Cristo no mundo político, ainda assim
o passivo daqueles que hoje não souberam desempenhar bem os seus
mandatos
parece falar mais alto. Esquecemo-nos de nomes históricos como Abraham
Kuyper,
na Holanda, William Wilberforce, na Inglaterra, Rev. Guaracy Silveira,
no
Brasil, os quais deram enorme contribuição ao avanço de leis sociais
justas. O último, na Constituinte de 1946, desempenhou relevante papel
que impediu a restrição da liberdade religiosa em nosso país.
Com esses
pontos em mente, veremos na próxima postagem que política é um tema altamente
espiritual e bíblico, do qual não podemos fugir sob pena de nos eximirmos de
nossas responsabilidades como cristãos, enquanto estamos no mundo.
fonte: Geremias do Couto
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